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Como Stan Lee e sua trajetória mudaram os quadrinhos para sempre

Stan Lee enfrentou a Comics Code Authority (CCA) que era até então a referência na produção de histórias em quadrinhos da época

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Crédito: (Divulgação/Disney)

Não é nada difícil de se imaginar que muitas pessoas, especialmente as mais jovens, não façam ideia do que é Comics Code Authority, e o que ela representa.

Seu selo de aprovação na capa dos quadrinhos deixou de existir em 2011, com apenas meia duzia de quadrinhos ainda se preocupando em ter aquele selo em suas capas na época. 

Mas por quase 60 anos, o Selo de Aprovação significou que os censores da Associação de Revistas de Quadrinhos da indústria da América aprovaram o conteúdo como aceitável.

Sem ele, muitos varejistas simplesmente se recusavam a vender os quadrinhos.

Nos dias anteriores à criação da CCA, os quadrinhos já haviam criado fama entre as massas sobre sua má influência sobre as crianças vulneráveis ​​da América.

Os professores criticaram como eles impactaram os hábitos de leitura dos alunos, os pais não gostaram que seus filhos escolhessem sua própria leitura de lazer e a igreja protestou contra o conteúdo imoral encontrado nos quadrinhos, como mulheres seminuas e a idolatria de vilões.

Especialistas em saúde mental logo entraram no coletivo, insistindo que as crianças se tornaram insensíveis à violência graças às ações dos personagens de quadrinhos. 

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Um psiquiatra acabou sendo a principal força de combate por trás da legislação dos quadrinhos: Dr. Fredric Wertham. Ele era um vendedor de óleo de cobra com um diploma.

Houve algum mérito em suas descobertas, mas ele evitou amplamente seus resultados em favor de anedotas sensacionalistas que apresentaria em reuniões, audiências legislativas e em publicações.

Seus esforços ainda não instigaram a legislação, então ele escreveu um livro para aumentar a conscientização sobre o perigo dos quadrinhos, Seduction of the Innocent, na primavera de 1954.

Isso finalmente colocou o Senado dos Estados Unidos em ação, lançando uma investigação sobre os efeitos dos quadrinhos e como eles estavam ligados a atos de delinquência juvenil, com audiências em abril e junho de 1954.

Um senador atacou Gaines, um editor da EC Comics, pela capa de sua obra que assustadoramente mostrava uma cabeça decepada e um machado ensanguentado, de forma tão incisiva e implacável que forçou Gaines a admitir que era de bom tom para uma história em quadrinhos de terror que houvessem imagens que remetam terror. 

Reconhecendo que os tempos eram outros e mudanças poderiam estar por vir, os editores formaram a Comics Magazine Association of America (CMAA) e seu código.

Gaines inicialmente resistiu a se juntar a seus colegas, mas os atacadistas entraram na onda de se recusaram a vender qualquer quadrinho sem a aprovação prévia do código, levando Gaines a ceder. Não durou muito. Gaines se demitiu da CMAA em outubro de 1955.

Os padrões de aprovação do código eram incrivelmente altos. Não poderia haver representações de sangue, sexualidade e violência excessiva.

Sem conversa fiada, desrespeito ou atrevimento contra figuras de autoridade. Se você queria cenas com vampiros, lobisomens e/ou zumbis, estava sem sorte.

E se você pensou que poderia ganhar algum dinheiro com publicidade nas páginas de sua revista em quadrinhos, certamente poderia. Mas não se anunciasse pecados mortais como bebidas alcoólicas, tabaco, fogos de artifício, cartões postais e muito mais. 

Sem gírias, sem palavrões, sem palavras como Terror ou Horror nos títulos das capas. Referências sobre religião e raça também não foram permitidos.

O código, essencialmente, neutralizou o meio dos quadrinhos, limitando o potencial inexplorado da criatividade explosiva ao simples. Embora não fosse obrigatório enviar os quadrinhos para avaliação, a única maneira de distribuí-los era ter o Selo de Aprovação.

Stan Lee não se subverteu as exigências do CCA

Enquanto isso, Stan Lee ultrapassava os limites da CCA, mas sem ao menos pisar nas bordas, em vez disso, encontrou maneiras novas e criativas de contar histórias que ressoaram de uma nova maneira com o público.

Lee usou seu fórum para explorar comentários sociais, como aqueles no poder poderiam usá-los para um bem maior, expandindo o alcance dos quadrinhos de jovens a adolescentes e jovens adultos. 

Lee teve tanto sucesso, de fato, que em 1971 o Departamento de Saúde, Educação e Bem-Estar abordou Lee sobre a criação de uma história em torno dos efeitos perigosos do vício em drogas, reconhecendo o quão impactante a Marvel Comics, e em particular o Homem Aranha, eram nas crianças.

A história que Stan Lee elaborou intencionalmente contornou a pregação para seus leitores, tecendo a mensagem antidrogas na história como um sub enredo.

Através das páginas de O Espetacular Homem Aranha edições 96 a 98, o Homem Aranha estava lutando contra o Duende Verde na trama principal.

Por trás disso, a história começou com Peter salvando um homem drogado, dançando em um telhado, de cair para a morte.

 A história foi apresentada ao CCA e foi rejeitada por mencionar drogas. Lee argumentou, apontando que a mensagem era claramente antidrogas, difícil de fazer sem mencionar as drogas em si.

Indiferentemente o CCA não cedeu, apesar do fato de o CCA não proibir especificamente a palavra drogas ou uso de drogas, mas com base no fato de violar uma seção geral que cobria qualquer coisa que “foi contrária ao espírito do código”.

Se vendo nessa situação aparentemente sem saída, Lee simplesmente deve ter tido “dane-se” e lançou os quadrinhos mesmo assim, sem aplicar o Selo de Aprovação nas edições.

A falta de aprovação não atrapalhou em nada as vendas, e a história em si foi elogiada por pais, professores e igrejas.

Teve o impacto social que o Departamento de Saúde, Educação e Bem-Estar, e o próprio Lee, esperavam. De repente, o CCA parecia completamente tolo em suas ações.

Após o julgamento incorreto da história antidrogas do Homem Aranha, o código foi enfim revisado. Agora, narcóticos e dependência de drogas eram permitidos, desde que apresentados como um hábito claramente danoso e vicioso.

Vampiros e lobisomens agora também eram permitidos, porque grandes autores de obras literárias clássicas como Frankenstein os referenciavam. Zumbis ainda não eram permitidos, mas o CCA já havia perdido sua força, com Lee e a Marvel debochando da restrição chamando os zumbis de suas histórias de “zuvembies” (um zuvembie é uma criatura usada por Robert E. Howard em seu conto Pigeons from Hell em 1938).

DC ameaçou parar de usar o selo do CCA

Quando a DC ameaçou parar de usar o selo, ainda mais revisões foram feitas em 1989, incluindo a permissão de personagens LGBTQ, mas o CCA nunca recuperou a autoridade que tinha antes do golpe que Stan Lee lhe deu em 1971.

Isso, juntamente com uma mudança na forma como os quadrinhos foram distribuídos (passando do varejo para lojas especializadas em quadrinhos que davam pouco valor ao selo CCA), viram o último suspiro de vida do Selo de Aprovação CCA em 2011.

O ato de coragem de Lee abriu as portas para uma indústria de quadrinhos amplamente desimpedida, onde trabalhos imaginativos são criados para uma ampla variedade de leitores.

Também provou que um homem, quando dotado de coragem e esperança, pode realmente fazer a diferença para o mundo.

Já sabia desses percalços da vida do aclamado Stan Lee?

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